C.S. Lewis nasceu em Belfast, Irlanda, em uma família protestante, e sua jornada rumo ao ateísmo começou ainda na infância e adolescência. Após perder sua mãe para um câncer quando tinha apenas nove anos, Lewis experimentou uma profunda crise espiritual. A dor da perda, combinada com uma educação religiosa que ele considerava superficial e sem profundidade, alimentou seu ceticismo em relação à fé cristã.
Durante sua adolescência e juventude, Lewis mergulhou em leituras de autores materialistas e desenvolveu uma série de poemas marcadamente niilistas e agnósticos, nos quais expressava sua rejeição às narrativas religiosas tradicionais. Esses poemas, escritos entre seus 17 e 22 anos, revelavam um jovem intelectual profundamente cético, que via o universo como um mecanismo aleatório e destituído de significado transcendental.
Seu período ateu durou aproximadamente uma década, estendendo-se por todo o início de sua vida adulta, desde a juventude até os seus primeiros anos como professor no Magdalen College, em Oxford. Durante esse tempo, Lewis abraçou um materialismo filosófico rigoroso, defendendo que a existência humana era essencialmente um produto de processos físicos e químicos sem qualquer propósito maior.
As Primeiras Influências: George MacDonald e G. K. Chesterton
Antes de sua conversão, Lewis foi fortemente influenciado por escritores como George MacDonald e G. K. Chesterton, cujas obras começaram a abrir seus olhos para a realidade espiritual que ele havia rejeitado por muito tempo. George MacDonald, autor de “Phantastes“, foi especialmente importante para Lewis. Em sua autobiografia Surpreendido pela Alegria, Lewis menciona que a leitura de MacDonald teve um profundo efeito sobre ele, fazendo-o perceber que havia mais no mundo do que o materialismo frio que ele conhecia.
Lewis descreve sua experiência de leitura de MacDonald como um despertar para a possibilidade de um “outro mundo”:
“O que foi para mim um novo mundo. Aqui estava um novo tipo de fantasia, que parecia, de certo modo, mais verdadeira que a realidade” (Lewis, Surpreendido pela Alegria).
Outro autor crucial na jornada de Lewis foi G. K. Chesterton, cujo livro O Homem Eterno apresentou a Lewis uma visão do cristianismo que ele não conseguia ignorar. Chesterton argumentava que o cristianismo, longe de ser uma religião ultrapassada, oferecia respostas profundas para as questões humanas eternas. Lewis mais tarde escreveu que O Homem Eterno foi um dos livros que “preparou o caminho” para sua conversão.
A Conversa Decisiva no Magdalen College
Apesar dessas influências literárias, foi uma conversa que Lewis teve em setembro de 1931 que desempenhou um papel decisivo em sua conversão. Naquela noite, Lewis se encontrou com dois amigos próximos, J. R. R. Tolkien (autor de “O senhor dos anéis”) e Hugo Dyson, nos jardins do Magdalen College, em Oxford. Eles discutiram, até altas horas da madrugada, a relação entre mito e verdade. Tolkien argumentou que o cristianismo era um “mito verdadeiro”, uma história que era ao mesmo tempo histórica e dotada do poder mítico de transmitir verdades eternas.
Alister McGrath, em sua biografia de Lewis, observa a importância dessa conversa:
“Foi uma conversa que durou até as primeiras horas da manhã, onde os amigos discutiram o que significava ver o cristianismo como uma história verdadeira, uma narrativa que cumpria os anseios mais profundos que todos os mitos despertavam, mas que também era histórica” (McGrath em A vida de C.S. Lewis).
Essa discussão mexeu profundamente com Lewis, que começou a ver o cristianismo não apenas como um conjunto de doutrinas, mas como a verdadeira história do mundo. Ela foi dramatizada e está disponível no YouTube (ative as legendas):
O Impacto da Morte do Pai
Um evento pessoal que teve um impacto significativo na jornada espiritual de Lewis foi a morte de seu pai, Albert Lewis, em 1929. Embora Lewis já estivesse em um processo de questionamento de seu ateísmo nessa época, a perda de seu pai o levou a refletir mais profundamente sobre a mortalidade e o significado da vida.
Em Surpreendido pela Alegria, Lewis escreve sobre o impacto da morte de seu pai:
“Com a morte de meu pai, toda a segurança e conforto desapareceram de minha vida. Eu tinha sempre contado com ele como uma espécie de pano de fundo permanente, um ruído familiar e aconchegante como o tique-taque de um relógio ou o murmúrio de um riacho.”
A morte de seu pai não apenas trouxe tristeza a Lewis, mas também o forçou a confrontar questões existenciais que ele havia evitado por muito tempo. Ele começou a refletir mais seriamente sobre a finitude da vida e a possibilidade de um significado além do material.
A Conversão: “Arrastado Para Dentro Chutando e Esperneando”
Apesar dessas influências e experiências, a conversão de Lewis não foi imediata. Ele descreve sua experiência em 1931 como um processo lento e até relutante. Em Surpreendido pela Alegria, ele escreve sobre sua resistência e eventual rendição ao cristianismo:
“Fui arrastado para dentro, chutando e esperneando, de olhos fixos em todos os lados em busca de uma chance de fuga. E o que me deixava zangado era que Deus me cercava por todos os lados” (Lewis, Surpreendido pela Alegria).
Em setembro de 1931, Lewis finalmente se rendeu e aceitou o cristianismo, uma decisão que ele descreveu como “a noite mais deprimente da minha vida”. No entanto, essa rendição marcou o início de uma nova vida, onde ele se tornou um dos mais proeminentes defensores da fé cristã.
Lewis descreve o momento de sua conversão com uma mistura de relutância e inevitabilidade:
“Você deve imaginar-me sozinho na sala daquele colégio em Magdalen, noite após noite, sentindo, sempre que minha mente se desviava nem que por um segundo do meu trabalho, a aproximação constante d’Aquele que eu tão ardentemente desejava não encontrar. Aquilo que eu temia tinha finalmente acontecido. Na Trinity Term de 1929 admiti que Deus era Deus, e me ajoelhei e orei: talvez, naquela noite, o mais relutante e desanimado convertido em toda a Inglaterra.”
A Influência Teológica de C.S. Lewis
Após sua conversão, Lewis rapidamente se tornou um dos mais influentes pensadores cristãos do século XX. Sua habilidade de explicar conceitos teológicos complexos de maneira acessível e envolvente o tornou um autor amplamente lido e respeitado, tanto nos círculos acadêmicos quanto entre o público em geral.
Alguns dos principais aspectos da influência teológica de Lewis incluem:
- Apologética Cristã: Lewis se tornou um dos mais respeitados apologistas cristãos do século XX. Seu livro Cristianismo puro e simples, baseado em uma série de palestras de rádio para a BBC, apresenta argumentos racionais para a fé cristã e tem sido influente por décadas.
- Imaginação e Fé: Lewis acreditava no poder da imaginação para comunicar verdades espirituais. Suas obras de ficção, como As Crônicas de Nárnia e a Trilogia Cósmica, são alegorias cristãs que têm introduzido incontáveis leitores a conceitos teológicos de maneira acessível e envolvente.
- Problema do Mal: Em O Problema da Dor, Lewis aborda uma das questões mais desafiadoras da teologia cristã: como um Deus bom e todo-poderoso pode permitir o sofrimento no mundo. Sua abordagem honesta e perspicaz continua a ser amplamente discutida e citada.
- Natureza do Amor: Em Os Quatro Amores, Lewis explora os diferentes tipos de amor descritos na tradição cristã, oferecendo insights profundos sobre as relações humanas e o amor divino.
- Vida Após a Morte: Em obras como A anatomia de um luto e O Grande Divórcio, Lewis oferece reflexões poderosas sobre a morte, o luto e a natureza da vida após a morte.
A influência teológica de Lewis é resumida por Alister McGrath:
“Lewis ofereceu uma visão do cristianismo que era intelectualmente robusta, imaginativamente atraente e espiritualmente transformadora. Sua capacidade de combinar razão e imaginação em sua apologética cristã continua a cativar leitores e pensadores até hoje.”
Conclusão
A jornada de conversão de C.S. Lewis foi um processo complexo e multifacetado, influenciado por autores que despertaram seu interesse pela espiritualidade, por amigos que o ajudaram a ver o cristianismo sob uma nova luz, e por experiências pessoais que o levaram a questionar suas suposições anteriores. Sua resistência inicial e eventual rendição ao cristianismo demonstram a luta intelectual e espiritual profunda que ele experimentou.
A subsequente influência teológica de Lewis tem sido vasta e duradoura. Através de seus escritos, tanto de ficção quanto de não-ficção, ele conseguiu tornar conceitos teológicos complexos acessíveis a um público amplo, inspirando gerações de leitores a explorar mais profundamente a fé cristã. Sua abordagem única, combinando razão, imaginação e experiência pessoal, continua a ressoar com pessoas de todas as esferas da vida, tornando-o um dos pensadores cristãos mais influentes e amados do século XX e além.